quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Outra Vida

Algumas coisas estranhas acontecem no lugar de onde venho. Carneiro de rastafari passeando na coleira. Velho de bicicleta em cima da árvore colhendo manga. Algumas coisas de anormais acontecem na casa de onde vi, te vi. Fantasmas e assombros sondam a noite. Moedas pulam da parede nas costas de quem não quer ver. Te vi no escuro. Enquanto a criança chorava de fome, a criança cega que também te vê. Re conhecia seus traços. Ri no escuro, zomba da minha cara amarela de medo. Durmo e não sonho mais. Apenas cochilei e já era manhã.

sábado, 25 de dezembro de 2010

Buracu

Minha Nossa Sinhora!
Quandu durmo di noiti só me vem nas idéia o buracu.
Eu limpanu o buraco, buraquera limpanu eu.
Buraco di lixo, lixo di cumida, qual diferença di buraco da terra?
Cumida e corpu no final vai tudo pru buracu.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Quais são seus questionamentos?
Seu passado esteve ao seu lado hoje?
O que tem a perder?
O que é realmente estar vivo?
Talvez tudo esteja escrito num livro de receitas.
Chegue até a copa, desça o degrau, arraste o Barney que estará aos seus pés pedindo por atenção, continue andando em direção ao lado direito, atravesse a mesa pelada, veja o armário azul, ali na gaveta está o que procura, abra, mas devagar empurrando um pouco para cima e para esquerda, não se lembra da última vez que ainda estava boa, o peso dos papéis já sobrecarregou, qual deles escolher para o que precisa? Qual a receita mais proveniente?

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Diário da aula

REDONDO – ESTACATO – GRANDE
  • Lento – pegando amendoim – ação original
  • Rápido – escondendo a nudez – ação original
  • Flácido – ajudando passarinho a voar – ação original
  • Tenso – livrando das correntes – tentar se livrar das jaulas onde está o ninho
  • Pesado – debaixo da lona – saída do ovo
  • Leve – ventando no rosto – ventando das asas dos passarinhos

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Uruguaian

Essa noite foi dia, não amanheceu.
Ao som do cajon e violão, senti vibrações das palmas, uma tocando na outra.
A mão se levanta suavemente, e volta cheia de atritos sonoros ao instrumento.
As cordas mostram o caminho forte e amargo que devem percorrer, em quase nunca suave.
A voz que toma conta do espaço, bar sujo de coca, trepadeiras, badulaques, vinil, aqueles que eu mostrei pra você.
A voz encanta é sereio, entoa hinos não entendíveis aos ouvidos humanos, mas que apenas pela forma de expressar e se manifestar, faz sentido algum.
É todo nosso o caminhar.
Sabiás e canarinhos tentam nos enganar dizendo que é manhã, mas como ser manhã se ainda nem anoiteceu?
O canto ecoa no espaço, nas copas.
O silêncio pairou num grito espantado de prazer.
Desafino, continua a música, agora não mais em harmonia, mas em mentiras avulsas, palavras soltas, pouco compartilhadas.
Foi pecado, falar da noite enquanto ainda era dia, foi pecado manter o dia quando já era noite.

domingo, 28 de novembro de 2010

Ausência

Somos criaturas que desconhecemos a morte, ou tememos ela por causa da ausência total do todo, mas ela vai, passa pela gente, deixa essa ausência, e depois só permanece na lembrança, voltamos a ter nossas vidas, frágeis, continuamos a nos vestir, comer, voltamos ao trabalho rotineiro, às dúvidas, constatações e pensamentos que nos perseguem a todo tempo na idéia, cachola dentro da mente vazia ou cheia de coisas que sempre nos levam a algum lugar que é lugar nenhum.
Ausência total.

 
"As cores podem ser violentas ou suaves. Elas podem se entrechocar ou ser harmoniosas. Elas podem transmitir ou destruir determinada atmosfera. Sua reprodução pode ser falsa - mas quem sabe qual é a verdadeira?"
 Fotografia com Bom Senso - Leonard Gaunt

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Casamento

Escutava o Tom
Maiores, menores em ré sustenido
Enquanto lembrava de você
Res-pi-ra-ção-res-pii-raa-ção
Reespi-raa-ção-ress-pi-ração
Definia o ritmo da música

Numa junção harmônica
entre ela
A letra toda se desfazia em você,
era todo poesia
Violão,canção, respiração, unção
Ao delatar a letra para a amada
E você
Escutava o Tom
E perdia na memória do sonho idealizado
De algum dia ganhar com algodões, bordões
Formados pelo sociosacro 
Escutava Tom

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

DIa dE eGO

Ele é o meu olhar, rápido, tenso, reto
É todo olhar, perdido sonhador
Em meio a carateres contínuos
voadores, escorpiões, colheitadeiras, pizzaiolos
Tem som, vibração desacelerada
Do estado plano, alto, baixo, médio
Metido em ombros azuis
Medido em clave de sol



P.S.: Mais tarde descobri que meu olhar não era tenso, mas sim flácido

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Índios na noite

Eram dois índiosinhos. Um tinha asas para voar, outro grandes pés para andar em meio as matas e se manter firme na terra.
Num dia de sol os dois saíram na função de desvendar alguns mistérios da floresta. Logo ao entrarem na mata uma forte corrente de vento veio ao encontro deles. O vento soprava e dizia coisas sobre a vida de cada um, os fortaleceu com esperanças e boas noticias de antepassados, que só essa massa transparente cheia de energia e força teria guardado para mais tarde oferecer aos seres que viviam naquele lugar.
Caminhando e conversando, falavam muito, cada um falava sobre o que via, um em cima, descrevia as árvores, as folhagens verdinhas e outras amareladas, flores, frutos, as coisas que via à distância, o de baixo falava sobre troncos, nascentes, espinheiras, bichinhos da terra, coisas que compreendia detalhadamente.
A noite chegava, e a mata começava uma melodia de dança e ritmos numa só harmonia. Aos poucos vagalumes desfilavam em meio aos lírios, olhinhos de gatinhos, saídos do ninho na noite em busca de alimentos, apareciam e desapareciam, o grilinho se mostrava através da cantiga, cobras confundiam-se com cipós, a cachoeira silenciava para escutar os peixes que em grandes saltos demonstrativos reluziam à luz da lua.
A noite dos dois era uma grande fantasia, mitos descritos no escuro.
A lua ainda iluminava o caminho, formando máscaras de reflexo nos personagens, contornando o olhar com peso e delicadeza.


Em homenagem a quem esteve iluminado pelo luar enquanto desvendava esse grande mistério que é estar em outra pessoa.

Cigana

Olhos cor de flamenco escorrem na alma cigana
Olhos que dizem danças de bençãos
Com lenços enrolados e pulseiras de brilho
Era cigana Maria Rosa indicando o caminho, lendo a mão da gente
Eram olhos de gata, profundos fortes, eram olhos variados
Olhos que diziam ser à maneira correta as escolhas da gente
Banhado em maracujá e arruda, vela amarela, descarrego da alma
Olhos que diziam o caminho da gente

Fase

Morreu o herói de histórias em quadrinhos.
Nasceu as lendas da mata,
mitos que levam a crer que são gregos.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

"E ali dentro está a vontade, que não morre. Quem conhece o mistério da vontade, com seu poder? Porque Deus é apenas uma grande vontade que penetra todas as coisas graças à força de sua aplicação. O homem não se submete aos dêmonios, nem se rende inteiramente à própria morte, a não ser pela debilidade de sua fraca vontade"

Edgar Allan Poe

terça-feira, 16 de novembro de 2010

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Ane

A morte corta como um avião, uma bala de um revólver sem calibre, corta a sangue frio
Numa vida que já foi quente de paixões, de amores que acordam juntos e permanecem grudados
E lá se vai a vida, uma última visão no teatro vazio, houve a compra do silêncio pelo casal

Maçã

Na minha lembrança tem um cheiro doce. Esverdeada com pontinhos vermelhos, ou vermelha com pontinhos verdes? O envoltório brilha, dando uma sensação pueril e limpa. Aquela ponta áspera até um certo ponto me enoja.
Crunsh!
Sonoplastia paralisada durante alguns segundos. Crunsh, crunsh...
Água na boca, dentes decisivos, maxilar móvel, malemolente.
Doce, como uma fruta, como um sorvete, como o açúcar que dentro do potinho lacrado não tem lambidas de formigas, como o mel.
Bagaço bom, bagaço papa, que desce como algodão pela garganta seca de fome.

Dois corpos

Houve a dança
dois corpos enérgicos correm para encontrar a velocidade máxima, 140°
Ouve a dança
cada faísca de movimento era estritamente natural,poética, descrita na forma do olhar

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Bicicleta

Primeira impressão, há a indiferença, a estranheza. Conserva seu estado de distância. És dominador. Como um bicho doméstico a coloca em meio a ferros, armadilhas armadas, correntes engraxadas por um óleo preto, como o que existe em você, pensa. Intimida a a sua peculiaridade. Você sempre pensa. Se mete a reconhecer os estados de sua flexibilidade. Às vezes com força brutal, ás vezes com certa delicadeza, mas sempre com a impulsão de quem tem um destino traçado. Já se tornou sua distração. Te traz prazer. Tem um certo reconhecimento de ambas as partes. Estão quase um. Um meio fio, um risco no chão, um pedestre que nunca olha pra frente. Um sol, um estado, um clima, um tempo. Um no prazer de estar só, estar um. Os trajetos já eram traçados, teias de destino que se desenrolam pelo preto do asfalto, você. Pensa. O embalo. Gira, gira, gira, gira, gira, gira, gira , gira...o sinal! Gira, gira, gira! Permanece no ritmo, rápido apressado. Aumenta a altura. Diminui a força. Diminui a velocidade. Aumenta o prazer. O sangue circula cada vez mais pelo seu corpo, vai dominando cada parte dele. Sua virilha em prantos relaxa. Se solta num estado de satisfação. De orgulho por estar quase lá. Seu sangue passa pelas pernas. Não se queixa, está quase no ápice. O embalo não te satisfaz mais, precisa de força. Integridade. O sangue chega aos dedos da mão e isso te excita. Esqueça as cãibras. Sua missão está por se fazer completa. Aaaaaa! Solta um grito. Leveza. O vento no rosto te faz lembrar da vida que ainda existe dentro. O preto do asfalto. O sangue chega à cabeça. Lateja. O crânio em constante movimento. Pequeno. Grande. Pequeno. Grande. Ah o prazer. Ah a ressaca. Lembra de correr. Suas pernas já não correspondem ao seu cérebro. Cai o seu reinado. Está em casa. Já não tem poder para domina-la mais. Se tornou maior. Mais poderosa, consegue controlar suas sensações e emoções. Sem se dar conta você se entregou. E agora, ao chegar, ao se dar conta, renega. Se esfola. A culpa não foi sua, foi dela. Sangra. A culpa não foi sua, foi dela. Volta ao quarto escuro. Quadrado. Pequeno. Úmido. Vazio. Volta ao seu lugar. Chegaram juntos ao destino.
"Mas nem toda asa é capaz de alcançar a liberdade plena.
 A maior conquista é sempre reconhecer o real propósito de voar."